Embora a perspectiva de longo prazo para a classe média brasileira permaneça positiva, o sentimento entre os consumidores e investidores piorou significativamente nos últimos três anos, segundo relatório da Moody's sobre América Latina, denominado "Latin America's Middle Class Growth Slows, Tempering Prospects for Retailers, Banks and Homebuilders".
Após registrar trajetória de elevação consistente na década passada, o crescimento da classe média na América Latina passou a ser moderado. A desaceleração no crescimento provavelmente terá um impacto econômico amplo, mas deverá afetar especialmente as empresas varejistas, montadoras de automóveis, construção civil, aéreas e comerciantes de itens de elevado padrão, dependentes de concessão de crédito e não essenciais.
O estudo destaca que o freio na classe média ocorre após um forte movimento de mobilidade social. Entre 2000 e 2010, o grupo nessa faixa de renda cresceu 50%, alcançando 150 milhões de pessoas nos seis países acompanhados pela agência, de acordo com dados do Banco Mundial. No mesmo período, o chamado PIB per capita cresceu 31% e a desigualdade de renda, medida pelo índice de Gini, diminuiu de 0,57 para 0,52 (quando mais próximo de 0, melhor).
O período também foi marcado por uma queda do nível de desemprego em todos os países, além de um aumento de renda. A Moody's calcula que cerca de 70% da redução da pobreza percebida na América Latina foi resultado de ganhos salariais.
A Moody's também detalhou no relatório o desempenho de outras economias da América Latina, como Argentina, Chile, Peru, México e Colômbia, e apontou que o crescimento econômico da região está desacelerando, afetado negativamente tanto por consumo como por investimento. "Isso se segue a uma década de crescimento econômico forte, salários em elevação e aumento dos gastos com consumo, que impulsionaram mais latino-americanos para a classe média do que em qualquer época anterior”.
A projeção da agência é de que a expansão em Argentina, Brasil, Chile e Peru fique abaixo da taxa média de crescimento registrada durante o período de 2004 a 2013. O México será o único país a apresentar evolução superior à sua média histórica.
"A maior queda no desemprego ocorreu no Brasil, Peru e Colômbia. Essas melhoras no mercado de trabalho foram acompanhadas por reduções no desemprego estrutural, com a Colômbia alcançando os maiores ganhos", diz a Moody's.
A qualidade das garantias nas securitizações, de acordo com a Moody's, também deverá se enfraquecer à medida que financiadores afrouxem os padrões de subscrição para acelerar as originações. A projeção da agência é de que a expansão na Argentina, Brasil, Chile e Peru fique abaixo da taxa média de crescimento registrada durante o período de 2004 a 2013. O México será o único país a apresentar evolução superior à sua média histórica.
A Argentina é o país em maior risco. No ano passado, inflação descontrolada, taxas de juros elevadas e uma recessão dolorosa forçaram o consumidor a reduzir gastos de forma drástica. Como resultado, a concessão de crédito bancário está declinando.
No Chile e no Peru, uma desaceleração econômica neste ano resfriou os gastos com consumo, enquanto declínios no investimento em mineração e os preços mundiais para as commodities exportadas pelos dois países resultaram em crescimento mais lento. No Chile, apenas as medidas de estímulo do governo devem conduzir a um crescimento levemente mais forte em 2015. No Peru, uma recuperação em 2015 deverá ser conduzida por emprego mais forte e confiança do consumidor em um nível mais firme.
Na Colômbia, as condições econômicas permanecem favoráveis e os gastos dos consumidores provavelmente vão se manter nos níveis atuais, à medida que a economia continue tendo expansão. O crescimento do crédito deverá permanecer forte, embora deva começar a ter moderação com o aperto da política monetária pelo banco central.
As recentes reformas econômicas no México devem melhorar a competitividade, conduzir a um crescimento mais rápido que deve beneficiar os consumidores da classe média no longo prazo. Gastos mais elevados do governo, especialmente em infraestrutura, e uma aceleração da economia dos EUA, importante parceiro comercial, devem impulsionar a demanda e levar à criação mais rápida de empregos e crescimento dos salários.
A agência projeta que o Brasil cresça 0,7% neste ano, e até 1% no ano que vem. Ritmo bem inferior ao registrado entre 2004 e 2013, de alta de 3,7%. Na Argentina, a situação é ainda mais crítica, com a previsão de contração de 2%, contra crescimento médio de 5,6% nos nove anos anteriores. Já a Colômbia deve manter o ritmo de crescimento, entre 4,7% e 4,8% nos próximos anos.
Até nos países onde há previsão de alta, a expectativa é que o crescimento não seja mais tão influenciado pelo consumo das famílias.
"No México, o mais provável é que o crescimento seja puxado pelos gastos do governo e estímulo para uma economia mais dinâmica. No Peru, gastos do governo e investimentos em mineração vão guiar o crescimento, enquanto na Colômbia, gastos em infraestrutura devem ajudar a economia a sustentar o ritmo de crescimento", destaca a agência.
O levantamento considera a classe média como o grupo com renda US$ 10 e US$ 50 per capita por dia (medido em paridade de poder de compra, um cálculo que equipara diferentes moedas). Excluindo a chamada "classe média vulnerável", com mais risco de voltar à faixa de pobreza, o Brasil é o segundo país com a maior classe média, proporcionalmente, entre os países que compõem o estudo. Segundo o Banco Mundial, 32% da população do país está nesse grupo de renda, atrás apenas do Chile, onde o percentual é de 42%.
Segundo a agência, "a redução das perspectivas de crescimento econômico no Brasil e a deterioração da posição fiscal do país tiveram impacto direto no ambiente operacional dos estados e municípios brasileiros".
Na avaliação da Moody's, as notas permaneceram as mesmas — em detrimento das perspectivas — porque "a forte supervisão que o Brasil exerce sobre seus estados e municípios tem se traduzido em atividade de empréstimo limitada e, consequentemente, em um declínio nos níveis de endividamento".
Na América Latina, a agência aponta que os setores mais vulneráveis são o de construção civil, siderurgia, automotivo e fabricantes de eletrodomésticos.
A agência ainda diz que investimentos e gastos governamentais, e não gastos dos consumidores, devem conduzir a uma "recuperação moderada" em grande parte da região no ano que vem.
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